As joaninhas são um dos raros exemplos de insetos com uma
boa visibilidade popular. São temas de aniversários e bons nomes para crianças.
Fáceis de desenhar e boas para pintar (no clássico desenho da joaninha vermelha
com pintas pretas). Mas existe uma verdade obscura por trás do rostinho feliz
que acreditamos que ela tenha: são predadoras vorazes de outros insetos.
Na Entomologia (ciência que estuda os insetos) as joaninhas
podem ser classificadas em dois grandes grupos de acordo com o que comem: as
coccidófagas (que consomem cochonilhas, outro inseto esquisito, que parece
tudo, menos um inseto) e as afidófagas (que comem os pulgões). Geralmente uma
espécie de joaninha que come basicamente cochonilhas não encara com bons olhos
um grupo de pulgões. Da mesma forma, as joaninhas fanáticas por pulgões viram a
cara para as gordinhas cochonilhas. Uma não se mete na dieta da outra. São
chatas para comer.
Mas, assim como nós, existem diferentes níveis de preferência
alimentar. Digamos que você adora uma pizza de calabresa, quentinha, feita na
hora. Mas você acorda e descobre que foi um sonho, e só tem um sanduiche de
queijo. Problema? Nenhum. Você come o sanduíche, mesmo que a cada mordida pense
na sua pizza. Pois é, com insetos a coisa geralmente não é tão simples. Quem
come pizza SÓ come pizza. E quem come sanduiche de queijo SÓ come sanduiche de
queijo. Só que agora temos algumas informações novas sobre o assunto.
A joaninha chamada Cryptolaemus
montrouzieri pertence a ao grupo das fanáticas por cochonilhas. São
organismos usados em uma técnica agrícola chamada controle biológico, pois comem muito, muito mesmo, as vilãs
cochonilhas. Agricultores com excesso de cochonilhas podem recorrer a esse
besourinho para limpar suas plantações.
Num estudo recente, pesquisadores da Bélgica mostraram que a
criptolemus (vamos chamar ela assim, pra ficar fácil pra todo mundo) é boa de
boca, saindo do padrão das “eu-só-como-cochonilhas”. Eles ofereceram nada menos
que oito tipos diferentes de alimentos (ninfas de duas espécies diferentes de
pulgão, ovos de outras joaninhas, ovos de percevejos e ninfas de trips – outro
inseto que você nunca ouviu falar e que é feio pra cacete) e foram ver como a criptolemus
se comportava.
Como são insetos, não dá pra fazer uma simples pesquisa de
opinião para saber o gosto de cada coisa. Os cientistas tiveram de bolar formas
de julgar se cada comida era boa ou não. E para fazer isso, mediram umas coisas
que chamamos de parâmetros biológicos,
que, em outras palavras, é contar quanto tempo a joaninha cresce, quantos ovos
coloca e qual seu peso quando fica grandinha. Ah, e não se esquecer também de
quantas sobrevivem até ficarem adultas.
Os cientistas notaram que, mesmo classificadas como
coccidófagas, não tinha tempo ruim para elas. Comeram quase tudo. Só não vingou
os que tiveram de comer trips e ovos de percevejo (eca!).
Mesmo a contra-gosto
(nos experimentos, não tinha opção de escolha), os criptolemus consumiram um
bocado, crescendo e colocando ovos. Não cresceram tanto nem colocaram tantos
ovos quanto as joaninhas que comeram cochonilhas, mas os resultados foram
reveladores. Mostrou que, mesmo sem ter o filé mignon, os criptolemus aceitam
na boa um churrasquinho de gato.
O estudo sugere outra coisa: as comidas preferidas pelo criptolemus
são moles! Cochonilhas são moles! Ovos não deram muito certo porque tem casa dura. Já as ninfinhas de pulgão e mosca branca foram um prato cheio. São um
pudim pra elas. E também não pode ser uma coisa muito rápida. As ninfas de
trips correm um bocado, e viviam driblando os criptolemus. Imagine um tanque de
guerra perseguindo uma Ferrari?
Por que essa pesquisa é importante? Com esses resultados,
agora os cientistas sabem que o criptolemus consegue sobreviver mesmo quando
não tem cochonilha no mercado. Se você for um agricultor e quiser acabar com
suas cochonilhas, coloque o bat-sinal e a criptolemus vai lá varrer as
cochonilhas de seu quintal. Se acabar, ela ainda pode pegar pulgões e moscas
brancas como saideira. Mas os cientistas alertam: não é impossível que algumas
tomem gosto por outros insetos e passem preferir eles. Isso deve ser levado em
consideração.
Para quem quiser, a referência do artigo é esta:
Maes, Sara; J-C. Grégoire, P. De Clerq. 2014. Prey range of
the predatory ladybird Cryptolaemus
montrouzieri. BioControl 59: 729-738
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