segunda-feira, 28 de março de 2016

Besouros tem dieta mais ampla do que imaginamos

As joaninhas são um dos raros exemplos de insetos com uma boa visibilidade popular. São temas de aniversários e bons nomes para crianças. Fáceis de desenhar e boas para pintar (no clássico desenho da joaninha vermelha com pintas pretas). Mas existe uma verdade obscura por trás do rostinho feliz que acreditamos que ela tenha: são predadoras vorazes de outros insetos.

Na Entomologia (ciência que estuda os insetos) as joaninhas podem ser classificadas em dois grandes grupos de acordo com o que comem: as coccidófagas (que consomem cochonilhas, outro inseto esquisito, que parece tudo, menos um inseto) e as afidófagas (que comem os pulgões). Geralmente uma espécie de joaninha que come basicamente cochonilhas não encara com bons olhos um grupo de pulgões. Da mesma forma, as joaninhas fanáticas por pulgões viram a cara para as gordinhas cochonilhas. Uma não se mete na dieta da outra. São chatas para comer.

Mas, assim como nós, existem diferentes níveis de preferência alimentar. Digamos que você adora uma pizza de calabresa, quentinha, feita na hora. Mas você acorda e descobre que foi um sonho, e só tem um sanduiche de queijo. Problema? Nenhum. Você come o sanduíche, mesmo que a cada mordida pense na sua pizza. Pois é, com insetos a coisa geralmente não é tão simples. Quem come pizza SÓ come pizza. E quem come sanduiche de queijo SÓ come sanduiche de queijo. Só que agora temos algumas informações novas sobre o assunto.

A joaninha chamada Cryptolaemus montrouzieri pertence a ao grupo das fanáticas por cochonilhas. São organismos usados em uma técnica agrícola chamada controle biológico, pois comem muito, muito mesmo, as vilãs cochonilhas. Agricultores com excesso de cochonilhas podem recorrer a esse besourinho para limpar suas plantações.

Num estudo recente, pesquisadores da Bélgica mostraram que a criptolemus (vamos chamar ela assim, pra ficar fácil pra todo mundo) é boa de boca, saindo do padrão das “eu-só-como-cochonilhas”. Eles ofereceram nada menos que oito tipos diferentes de alimentos (ninfas de duas espécies diferentes de pulgão, ovos de outras joaninhas, ovos de percevejos e ninfas de trips – outro inseto que você nunca ouviu falar e que é feio pra cacete) e foram ver como a criptolemus se comportava.

Como são insetos, não dá pra fazer uma simples pesquisa de opinião para saber o gosto de cada coisa. Os cientistas tiveram de bolar formas de julgar se cada comida era boa ou não. E para fazer isso, mediram umas coisas que chamamos de parâmetros biológicos, que, em outras palavras, é contar quanto tempo a joaninha cresce, quantos ovos coloca e qual seu peso quando fica grandinha. Ah, e não se esquecer também de quantas sobrevivem até ficarem adultas.

Os cientistas notaram que, mesmo classificadas como coccidófagas, não tinha tempo ruim para elas. Comeram quase tudo. Só não vingou os que tiveram de comer trips e ovos de percevejo (eca!). 
Mesmo a contra-gosto (nos experimentos, não tinha opção de escolha), os criptolemus consumiram um bocado, crescendo e colocando ovos. Não cresceram tanto nem colocaram tantos ovos quanto as joaninhas que comeram cochonilhas, mas os resultados foram reveladores. Mostrou que, mesmo sem ter o filé mignon, os criptolemus aceitam na boa um churrasquinho de gato.

O estudo sugere outra coisa: as comidas preferidas pelo criptolemus são moles! Cochonilhas são moles! Ovos não deram muito certo porque tem casa dura. Já as ninfinhas de pulgão e mosca branca foram um prato cheio. São um pudim pra elas. E também não pode ser uma coisa muito rápida. As ninfas de trips correm um bocado, e viviam driblando os criptolemus. Imagine um tanque de guerra perseguindo uma Ferrari?

Por que essa pesquisa é importante? Com esses resultados, agora os cientistas sabem que o criptolemus consegue sobreviver mesmo quando não tem cochonilha no mercado. Se você for um agricultor e quiser acabar com suas cochonilhas, coloque o bat-sinal e a criptolemus vai lá varrer as cochonilhas de seu quintal. Se acabar, ela ainda pode pegar pulgões e moscas brancas como saideira. Mas os cientistas alertam: não é impossível que algumas tomem gosto por outros insetos e passem preferir eles. Isso deve ser levado em consideração.

Para quem quiser, a referência do artigo é esta:

Maes, Sara; J-C. Grégoire, P. De Clerq. 2014. Prey range of the predatory ladybird Cryptolaemus montrouzieri. BioControl 59: 729-738

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